Hino do Natal 2019 pergunta se hoje Jesus seria cristão

Se vivesse hoje, Jesus seria cristão?

Seria um tema para um bom hino de Natal.

A relação da música com festas religiosas remonta ao primitivo de todos nós. Dezenas de milhares de anos atrás, as primeiras religiões já nasceram ao som de tambores. E durante muito tempo não havia distinção entre a música e o místico. Hoje, não há religião inventada por nós que não se relacione com música. Mantras e rezas são músicas. E por música é mais fácil popularizar religiões, levar a qualquer um a palavra do divino.

Com o cristianismo não é diferente. Os mais antigos cantos de Natal, festa roubada pela religião de Cristo da Saturnália pagã dos romanos, que comemoravam em dezembro o deus da colheita, Saturno, distribuindo presentes entre si.

Jesus, tendo existido ou não, revolucionou tudo. Suas ideias originais, foram, através dos séculos, invertidas. Ele dizia uma coisa, hoje dizemos que ele dizia outra.

“Jesus, se hoje fosse vivo, não seria cristão” – Observou, no século XX, o incrível Carter Woodson, fundador da Associação para o Estudo da Vida e História Afroamericana.

Mas uma coisa não muda. A música. Os hinos de Natal. Jingle Bells evoca crianças ricas brincando na neve com seus brinquedos.

Aqui, em 2019, surgiu uma alternativa. Um hino de Natal para chamar de nosso. O samba-enredo da Estação Primeira de Mangueira faz também o exercício de imaginar Jesus de Nazaré, se fosse vivo hoje, e morasse no Brasil.

O samba, composto por Luiz Carlos Máximo e Manu da Cuíca, hoje uma das maiores compositoras da música popular brasileira, conclui que Jesus teria “rosto negro, sangue índio e “corpo de mulher”.

É o que eles chamam de “Jesus da gente”.

De fato, esse Jesus que, usado para tanto enriquecimento e concentração de renda, o Jesus das promoções de supermercados e de smartphones e dos bônus de fim de ano pelo rendimento na administração de carteiras no mercado de ações, parece um Jesus dos outros.

Um Jesus de poucos.

Um Jesus pra quem vive na Faria Lima.

Segundo o samba da Mangueira, o Jesus da Gente nasceu “de peito aberto, de punho cerrado”. Como o nazareno, o nosso cristo brasileiro é também filho de “pai carpinteiro desempregado” e de “Maria das Dores Brasil”.

Enxuga “o suor de quem desce e sobe ladeira”.

Se encontra “no amor que não encontra fronteira”. 

E pergunta “Mas será que todo povo entendeu o meu recado?”

Em um país, e num ano, onde a desigualdade entre poucos ricos e muitos pobres aumentou, o Jesus da Gente avisa:

“Não tem futuro sem partilha”.

Então, quando você estiver no aconchego do teu lar, entre família, debaixo de um teto, mesa posta, presentes na árvore, convém pensar no hino de Natal Brasil 2019.

Para facilitar, porque hoje é dia de tornar a vida do outro mais fácil, aqui vai a letra:

A Verdade vos fará Livre (Manu da Cuíca/ Luis Carlos Máximo).    

Mangueira

Samba teu samba é uma reza

Pela força que ele tem

Mangueira

Vão te inventar mil pecados

Mas eu estou do seu lado

E do lado do samba também

Eu sou da Estação Primeira de Nazaré

Rosto negro, sangue índio, corpo de mulher

Moleque pelintra no Buraco Quente

Meu nome é Jesus da Gente

Nasci de peito aberto, de punho cerrado

Meu pai carpinteiro desempregado

Minha mãe é Maria das Dores Brasil

Enxugo o suor de quem desce e sobe ladeira

Me encontro no amor que não encontra fronteira

Procura por mim nas fileiras contra a opressão

E no olhar da porta-bandeira pro seu pavilhão

Eu tô que tô dependurado

Em cordéis e corcovados

Mas será que todo povo entendeu o meu recado?

Porque de novo cravejaram o meu corpo

Os profetas da intolerância

Sem saber que a esperança

Brilha mais na escuridão

Favela, pega a visão

Não tem futuro sem partilha

Nem Messias de arma na mão

Favela, pega a visão

Eu faço Fé na minha gente

Que é semente do seu chão

Do céu deu pra ouvir

O desabafo sincopado da cidade

Quarei tambor, da cruz fiz esplendor

E Ressurgi no cordão da liberdade