O pensamento de Silvio Almeida em Roda Viva histórico

É de nossa história televisiva. Os programas de entrevistas, no Brasil, parecem se passar em outro país. Ou querer espelhar um país que não existe. Um país que quem detém os meios de produção de mídia gostaria que fossemos. Ou precisaria que fossemos para que fosse ainda mais fácil a manutenção de seus privilégios. Por isso, a edição de ontem do Roda Viva, cujo entrevistado foi o professor Silvio Almeida, um dos maiores intelectuais que o Brasil produziu, marca a história, como a visita de Milton Santos ao mesmo programa, em 1997. Principalmente pela forma como os assuntos abordados foi tratada pelo entrevistado. Na programação televisiva, Silvio pareceu vindo de um país chamado Brasil, comunicando-se com um país que, de 1891 a 1967, chamou-se Estados Unidos do Brasil.O próximo passo? Ouvirmos as intelectuais negras brasileiras. Neste passo, e neste espaço, extratos do que falou, de um pensamento que é, sobretudo, fruto de 1) muito estudo e trabalho 2) a história da luta dos movimentos negros no Brasil.

“As pessoas brancas brasileiras não são consideradas brancas fora do Brasil. E isso elas esquecem.”

“O racismo é incompatível com o desenvolvimento econômico. E mais: fica o recado às empresas. O racismo é completamente incompatível com o ambiente econômico estável do qual as empresas precisam para reproduzirem-se em um ambiente de negócios. A luta antirracista é algo fundamental para se falar no mínimo de estabilidade que torne possível a reprodução de uma vida econômica, mesmo nos extertores de uma sociedade capitalista e liberal.”

Citando o filósofo camaronês Achille Mbembe autor do ensaio Necropolítica: “Se antes o pensamento liberal falava da sustentação da vida humana como parte fundamental da administração do mundo, agora neoliberalismo inverte: produzir a morte em nome da reprodução de uma economia que não se pauta mais pela inclusão, mas pela exclusão daqueles que não são compatíveis mais com esse sistema. O neoliberalismo cada vez mais se pauta pelo corte de direitos sociais, austeridade, ou seja, a única maneira de administrar esse mundo é produzir a morte. E, nesse sentido, a raça tem um papel fundamental. A raça é um elemento de naturalização da morte do outro. Porque nós naturalizamos as mortes que acontecem nas favelas do Rio de Janeiro, nas comunidades periféricas de São Paulo? Porque justamente nós associamos a morte daquelas pessoas, negras em sua grande maioria, como um dado natural. A necropolítica se serve disso para determinar aqueles que vivem e aqueles que morrem em nome da reprodução da nossa economia.”

“Se a gente entender que economia são apenas números, tabelas, PIB, taxa de juros, taxa de lucros obviamente teremos dificuldade em aprender o significado de racismo estrutural.”

“A gente não pode falar de economia, direito, política e comunicação, sem tratar da questão racial. Como vamos falar de ciência, se desprezarmos um elemento que é central para a nossa realidade?”

“Os negros possuem sim projetos para esse país a muito tempo, a gente só precisa parar para ouvir.”

“As mulheres negras hoje lideram o movimento negro. […] É impossível pensar a dimensão da luta antirracista se não houver também uma luta pela igualdade de gênero, isso é fundamental.”

“É incompatível ser antirracista e defender política de austeridade e o desmonte do SUS

“Muito do que a gente está vivendo é resultado da fragilidade de uma sociedade que constrói instituições que tratam do racismo, mas não combate os elementos que dão forma e figura para o racismo, como a desigualdade econômica.”

“Os meios de comunicação são absolutamente coniventes com a construção do imaginário social do negro nesse lugar subalterno.”

 “Ser antirracista é incompatível com o desmonte do SUS e a precarização do trabalho”

“Não adianta tratar o movimento Vidas Negras Importam como fosse uma micareta racial.”

“Movimento negro é a solidariedade nas favelas, as escolas de samba e os terreiros.”

“Nós naturalizamos o racismo e entendemos que cabe apenas aos negros combatê-lo. Os brancos devem se engajar na luta antirracismo. Sem isso, os negros apenas resistem e não avançam.”

“Movimento negro é a solidariedade que existe nas favelas para proteger a vida das pessoas. O movimento negro são as escolas de samba. São os terreiros.”

“O racismo é algo que, se não tratado, compromete a democracia.”

“Ser antirracista é ser contrário a políticas de austeridade durante uma pandemia.”

“Dizer que o racismo é estrutural significa dizer que ele prescinde de intencionalidade. Não basta se educar para ser antirracista; é preciso uma educação que questione a estrutura que reproduz o racismo.”

“Representatividade importa, mas não é suficiente pra lidar com as questões relacionadas ao racismo.”

“Um partido de esquerda que não olha pra questão das identidades não está olhando pra realidade.”