Carnaval em fevereiro de 2021 é necropolítica
Os dados que emergiram do IBGE a respeito dos números da Covid-19 no mês de junho no Brasil aferiram: 70% dos que contraíram e/ou morreram da doença são pretos. Ou “pardos”, denominação usada por as pessoas pretas que, vítimas do eficiente sistema social brasileiro, que divide para conquistar, não entenderam que são pretas.
Serão mais de 100 mil mortos no país até fevereiro de 2021, época que, já se sabe, a peste chegou ao Brasil vinda de avião e trazida por gente que prática esqui em Aspen, trabalha no mercado financeiro, frequenta festa de casamentos em resorts de luxo na Bahia e turistas carnavalescos.
Evitar segundas e terceiras ondas até que as populações vulneráveis estejam vacinadas, o que só ocorrerá no segundo semestre de 2021, é não ser conivente com a necropolítica que quer eugenizar nosso país. Eliminar pretos e pobres.
O Carnaval é um momento de fundamental movimentação financeira para as populações vulneráveis. Como afirmou o professor Silvio Almeida no já antológico programa Roda Viva, em junho, “O movimento negro está, também, nas Escolas de Samba”. Um ano inteiro de trabalho, emprego e visibilidade que não pode parar.
Em São Paulo, a Águia de Ouro vem com enredo falando de Oxalá, com base em um ijexá composto pelo professor Luiz Antônio Simas. Carnaval das Escolas de Samba é, hoje, onde o genocídio etimológico que executa-se no Brasil, aquele que desaparece com palavras de dialetos de origens africanas e indígenas e a substitui por anglicismos, encontra enfim resistência.
Nos bloquinhos, onde a classe média branca se diverte, a população preta vulnerável ganha seus trocados empurrando no sol e no meio da multidão os pesados carrinhos que carregam bebidas geladas para aliviar a sede de sinhôs e sinhás que se têm como desconstruídos.
Enfim, pelo bem e pelo mal, Carnaval nos é necessário.
E, como diz o próprio professor Simas: Não se faz Carnaval porque a vida é mole, mas pela razão inversa.
Há, também durante o Carnaval, visibilização de assuntos políticos e do universo LGBTQIA+
Mas desejar tudo isso agora, já em fevereiro de 2021, é não se importar com a vida das 70 mil pessoas negras que terão morrido de Covid-19 até lá.
E adiarmos para maio significa, além de salvarmos vidas negras, reavermos os empregos gerados nos barracões das Escolas, hoje recolhidos.
Estamos em mais um daqueles momentos em que descobrimos quem de fato somos neste mundo. Sabermos quantos são os que se importam apenas com a própria diversão, e quantos são os que estão dispostos a abrir mão de privilégios para evitar o outro morra. Quantos são aqueles que dizer “Vidas negras importam” apenas da boca pra fora. Uma boca que deseja a boquinha dos privilégios.
Que venham os desejos.
E tudo o que eles costumam revelar.