Como passar Natal e Revéillon sozinho por amor ao próximo
Esse ano, um número significativo de pessoas irá passar as noites de Natal e Réveillon pela primeira vez sozinhas.
A segunda onda da Covid-19, e o amor próximo, levará muitos a evitar contato físico com família e amigos nas duas noites mais dramáticas do ano – que são, ou deveriam ser, sobre amor ao próximo.
Mesmo quem pensa estar preparado, será que de fato está?
Adiantará entender que optar por estar sozinho significa que você é uma pessoa melhor, que se importa com quem você ama?
Adiantará entender que estas datas não significam nada na prática da vida?
Adiantará lembrar que metade das pessoas do planeta não comemora Natal porque não é de sua cultura? Que um bilhão de pessoas, a população chinesa, comemora o ano novo só fevereiro?
Adiantará lembrar-se que criou-se uma sociedade onde mede-se sucesso pela quantidade de pessoas com quem você passa estas duas datas?
Adiantará entender que você não é um fracasso? E a pessoa que escolheu passar o Réveillon 2020 uma festa lotada de gente bonita não é exatamente uma vencedora?
Adiantará entender que estas pessoas, nas festas, sorrisos infectados postados nas redes sociais na hora da virada, estão mais sozinhas e perdidas no mundo do que você?
Adiantará tentar lembrar das pessoas que, ano após ano, e não excepcionalmente, passam estas datas sozinhas, com fome, com frio, nas ruas de cidade onde mora? Que existem orfanatos? Hospitais?
Pode ser que não.
Datas marcadas operam no nível simbólico, para além de nossa consciência. Ou seja, durante elas, até o mais racional e resolvido dos seres torna-se refém de suas emoções irracionais.
Por isso, o que fazer caso você opte por ficar em casa sozinho, ouvir os fogos, e ver da sua janela vizinhos comemorando de casa cheia, ouvir as risadas, e em sua casa o silêncio se instalar?
O que fazer quando na meia noite dos dos dias 24 e 31 de dezembro você olhar para o celular, para as redes sociais, e ver todo mundo acompanhado, menos você?
O que fazer quando a tristeza for tua única companhia?
Há uma história milenar, bantô, que fala de uma mulher que morava sozinha e uma noite muito fria recebeu a visita da tristeza personificada, ali em carne e osso. Batendo os dentes, tremendo-se toda, a tristeza pediu abrigo. Disse que que além do frio, estava sentindo-se muito só.
A mulher abriu as portas da casa, convidou a tristeza para entrar e a ofereceu um chá morno. Em seguida, a mulher pediu licença para ficar triste com a situação de sua convidada. Surpresa, a tristeza disse que ninguém nunca havia lhe pedido licença nem lhe servido chá.
A tristeza disse que todos que ela visitava sentiam-se envergonhados em recebê-la. Então, as duas passaram a noite conversando, como fossem velhas conhecidas. Entendendo uma a outra. No final, a anfitriã descobriu que a tristeza podia ser, no fim das contas, uma ótima companhia.
Não se envergonhar em passar uma noite em companhia da tristeza é fundamental.
Quem, no Brasil de 2020, não está triste, bom sujeito não é.
Nesse mundo, gente ruim da cabeça, ou doente do pé, não falta. Desde que o samba é samba é assim. Solidão apavora. Tudo demorando em ser tão ruim.
Se na noite de Natal e Ano Novo você não sentir vergonha em sentir-se só, você estará saudável não só por fora, mas também por dentro.
Exame clínico certificando de que você se importa com o outro.
Em 2020, estar triste é mais que um sinal de lucidez.
Estar triste é uma vacina.