Irrelevante e oportunista, ABL nada fez para merecer Gilberto Gil
Gilberto Gil foi eleito para vestir o fardão da Academia Brasileira de Letras.
A ABL, instituição que só é notícia quando há algum novo eleito. No resto do tempo, deu nenhuma contribuição factual, ou mesmo teórica, à cultura brasileira.
Antônio Maria, um dos maiores cronistas do Brasil escreveu, em meados dos anos 50, que se um raio fizesse todos os acadêmicos, menos Machado de Assis, desaparecessem, a cultura brasileira, a literatura inclusive, não notaria.
Ele exagera. Guimarães Rosa, terceiro ocupante de Cadeira 2, eleito em 1963, é um dos poucos que de fato é um dos constituintes de nossa cultura.
Mas a ABL não inspirou Rosa em seus escritos. Não incentivou Rosa em seus escritos.
A utilidade da Academia Brasileira de Letras é questionável. E, talvez, prejudicial para nossa literatura, pois ao eleger uns em detrimento a outros, mais escondeu grandes escritores e grandes obra brasileiras s do que consagrou.
Gilberto Gil, muitos outros muito menos cotados que ele para o fardão decorativo da ABL, fez mais por nossa cultura, e até pela cultura mundial do que os ilustres anônimos que formam a maioria de seus componentes.
No Rio de Janeiro, sede da ABL, acabou-se de terminar mais uma edição da FLUP, a Festa Literária das Periferias. Durante ela, tivemos competições de Slam Poetry, incluindo-se aí, o primeiro com poetas indígenas brasileiros. Eventos transmitidos pela Internet e vistos pelo público.
Podemos dizer que, se o Brasil, como nação, durar tanto quanto a China, que já tem seus 5 mil anos, podemos dizer que nossa cultura ainda está em uma incubadora. Ainda não nasceu de verdade. A carta de Pero Vaz Caminha foi escrita há pouco séculos. Nossa literatura nasceu ontem.
Entre o chamado período colonial, o romantismo, o realismo, o pré-modernismo, o modernismo e o pós modernismo, podemos dizer que tudo isso, no futuro, será chamado apenas de grande período colonial de nossa literatura.
É bastante provável que o século 21 marque o início da descolonização cultural do Brasil. Quando isso acontecer, Guimarães Rosa, Gilberto Gil, e gente hoje desconhecida, como os jovens poetas do Slam e nomes nunca contemplados pela ABL, sejam a verdadeira face de nossa cultura.
Talvez, no futuro, desintoxicados de nossa simplista concepção eurocêntrica de cultura, os brasileiros olhem para o passado e lembrem mais de Amarelo, de Emicida, do que de Ode ao Homem Natural, de Souza Caldas.
Talvez seja consenso o que muitos defendem: que em nossa cultura, o melhor de nossa literatura e filosofia está nas letras de nossas canções. Que nem estadunidenses conseguiram superar o Brasil em qualidade de letras de canções.
Até lá, talvez lembremos que letras de muitas canções brasileiras, como as de Gil, são mais sofisticadas que os tão respeitados koan japoneses.
Até lá, tentando não ser devorada pela tendência decolonial, espécie de tupinambá contemporâneo, a ABL, espécie de bispo Sardinha contemporâneo, tentará de tudo para não perder o privilégio de indicar o que é e o que não é merecedor de reconhecimento.
No futuro, entenderemos que ter sido eleito para Academia Brasileira de Letras foi o menor dos feitos de Gilberto Gil.
Que este sujeito já era imortal antes do convite.
Até lá, daremos os parabéns a Gil, e não o contrário.
Refazenda toda. Guariroba.