A trajetória dos negros no BBB 21

Quando, pouco depois das 23 horas do dia 23 de janeiro de 2021,  os participantes do BBB 21 se conheciam papeando animadamente na área externa da casa, dois deles, negros, começaram a engatar uma conversa a respeito de suas experiências com drogas, e a edição do pay-per-view mudou de câmera, o destino dos grupo de negros, em quantidade inédita na história do programa, foi selado.

O golpe estava aí: negros reforçando o estereótipo do negro unicamente associado à violência e à marginalidade.

Tudo que entretém nossa classe média branca é a possibilidade de ver negros para julgar, condenar e, por fim, salvar.

Como telespectadores, somos todos, sem exceção, sejamos de direita ou esquerda, bolsominions trumpistas. O que nos diverte é a treta. O que nos diverte é o caos.

Camilla de Lucas recusou-se a ser o caos, seja o sombrio, de Conká, Lucas, Projota e Nego Di, seja o luminoso, de Gil do Vigor, que diverte brancos.

E não furtou-se de ser braba, como seu melhor amigo, o professor João.

A jornada dos participantes negros do BBB nos ensinou algumas coisas.

1) O Brasil não tolera para mulheres negras inteligentes e arrogantes, com Lumena.

De outra cor, sim.

2) De todos os vilões que ja passaram por BBBs, e olha que estamos falando de homens acusados de agredir mulheres, de pedofilia e até estupro dentro do programa, a mulher negra será a que irá bater os recordes de rejeição.

3) Não aguentamos negros mauricinhos. Destes que têm restrições com comida e são viciados em videogame.

No imaginário do brasileiro, não há negros que não passam fome.

4) Os negros brasileiros não estão ainda acostumados com a diversidade de nosso povo. Da polifonia de nossos discursos.

5) O chamado Black Twitter é composto por negros e negras que resolveram ser o que brancos esperam de negros e negras. Esquecendo-se justamente de ser… negros e negras. Não levantaram Camilla de Lucas durante os 100 dias de programas. Abraçaram os negros que deram mais engajamento. Que jogaram o jogo do mercado.

Até o maravilhoso Gil do Vigor, o “gay sidekick da mocinha” que a cada 5 temporadas configura no programa, não é novidade para quem teve o privilégio de assistir ao melhor participante da história do programa: Daniel Rolim no BBB. Quem for atrás de vídeos de youtube de dez anos atrás do rapaz pode até achar que Gil os estudou com afinco matemático antes de entrar no programa.

O espectador muda, envelhece, e outros entram. Quem decide o programa é o público branco. A maioria da população negra do Brasil já está a esta hora dormido para pegar o busão das 4 da manhã para trabalhar.

Mas, às vezes, brancos melhoram. O escritor e dramaturgo Rodrigo França, d0 BBB 19, hoje seria um grande candidato ao título. Ná época, foi aqui fora tachado como preguiçoso. Porque deitado no jardim recusava-se a proporcionar tretas.

O BBB não difere muito das lutas de mandigo, onde senhores de escravos colocavam os seus para brigar até a morte.

Mas o BBB também é hoje mais que isso. Nos deu o único sujeito que fez o que parentes dos mais 400 mil mortos pela Covid-19 gostariam de fazer com nosso presidente.

Cuspir-lhe na cara.

Jean Willys vive hoje fora do Brasil. Gil do Vigor provavelmente tomará o mesmo caminho. Mas Camilla, João, Pocah, Carol e Lucas continuarão aqui, levando esse país nas costas, a história do povo preto no Brasil.

Esse outro show de realidade.